quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Dançar com os teus corpos

Dançar com os teus corpos
Imaginados
Bethânia a cantar
Beijar os teus lábios
No espaço projectados
Viver só e acompanhado
Porque os teus rostos
Estão sempre
Aqui ao lado
Envoltos em auras
Iluminados
Dançar com os teus corpos
Nus e vestidos
Enlaçados e contorcidos
Febrilmente
Apaixonadamente
Dançar com a memória

De ti

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Transition


Ni de la mort
La peur
Ni du lendemain
L´angoisse
Mais autre chose
Que la farce
La folie le délire
Un jet d´encre rouge
Sur un mur d´espace
Une poignée d´herbes noires
Sur un lac lasse
Des étranges foires
Des choses inutiles
Ou la mise a mort
Des toros séniles
Tout n´importe quoi
Qui s´explose en moi
Sans me faire tout dire
Car la vie subsiste
Et le monde existe
Quoi qu´il arrive à l´homme
Qui a encore faim
D´un nouveau lendemain
Même s´il est seul
Tous les bleus matins
Aimer sera l´esquisse
De dieu ou satan
Que le moment glisse
Qu´échue le temps
Ni de la mort
La peur
Ni du lendemain
L´angoisse
Mais autre chose
Que la farce

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Fim de dia no Alentejo


Cai o dia
Momento irrepetível
O sol e a lua em contraponto
O vermelho que beija o horizonte
A serra, o monte e mesmo a tua fronte
E o branco alvo que o abandona
Imita o uivo dos lobos distantes
E o voo dos morcegos que imagino
Oh! Se imagino

Cai o dia
E nesta turbulência
De silêncios entrecortados
As folhas inebriantes que nos rodeiam
Florescem na noite fria
Branca e fria como naquela matina
Em que te deste a sorrir
Bela e menina

Cai o dia
A noite avança
Numa escuridão que se avizinha
Céu estrelado
Vamos para outros mundos
De paixão
Homens alados
Surpreendidos pela beleza do Nada
Oh! Não, Verbo!
Suspende o vago
Que eu gosto muito de viver
Prefiro a emoção fervente de um beijo
Esfumando o horizonte
Que se apaga

Quanto ao dia
Que termina
É luz que não mais te afaga
Só resta no teu corpo
A memória do que no dia aconteceu
E assim, no sonho, acredito
O dia não morreu

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

As futilidades profundas


As futilidades profundas
Rasgam os céus
Dissolvem as nuvens
Em intensos carneirinhos
De algodão
Dobrar ou não dobrar um papel

Por uma questão de apresentação
Sonhar como quase todos sonham
Numa história de cordel
Que não avança nem atrasa
Mas que os põe em brasa
O mundo é uma emoção barata
É preciso é muita lata
Afinal na sua maioria
Filhos de manhosos investidores
De ares sofisticados ou mesmo doutores
Nem percebem do que se trata
Preenchem páginas abertas
Em forma de formulários repetitivos
Problemas como o dos relógios que se atrasam
(Já não se levam ao relojoeiro, os relógios
As profissões já não são o que eram dantes)
Sempre os mesmos aperitivos
E o mesmo uísque marado
Que infecta os neurónios
De cada momento mal passado
Prefiro o silêncio
Que dizem não se gasta
Ou o pensamento alado
Ao alcance de qualquer casta
Mesmo na indigna visão indiana
Que faz a lei em Madrasta
Onde se luta por acordar
Numa manhã qualquer
Sem o estômago colado às costas
Daria para perguntar
No meio de cheiros nauseabundos
Se eles, os vagabundos
Ou os outros de qualquer nome
Anseiam dobrar papéis antes de os ensacar
Na reciclagem ansiosa da sua fome?

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Contigo queria ainda

Contigo queria ainda
Dançar o Tango em Buenos Aires
Onde o desemprego entristece e revolta

E o Samba no Rio
Onde também se ouve o estertor da fome
E a droga nunca se esgota

Dançar o Flamenco em Sevilha
Onde cantam ciganos como se morressem
E vivem felizes aparentemente

E a dança do ventre em Ismaília
Onde no entanto isso não se dança
E o desejo é sempre indecente

De novo o desejo de viver
Amando-te como anseias e o teu ser
Merece
Que é como quem recita
Um poema em forma de vida
E desvanece

Contigo queria ainda
Levar-te para a menina que encontrei
Numa curva da vida
Onde o desejo nos perdia
Animais selvagens
Da noite dia

Contigo queria ainda
Amar como se ama a vida
O Mar o Sol e o Universo
Contigo queria ainda
O Excesso

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Já te escrevi palavras de amor...



I

Já te escrevi
Palavras do amor
Depois escondidas
Nos meandros da vida
Já me dedicaste poemas
Rasgados depois
Nas fúrias da noite
Já partilhamos
Momentos de sorte
Já vivemos acima
Das nossas vontades
Já fomos felizes
Já quisemos viver
Numa casa fechada
Onde nos fustigássemos
Na carne rasgada
Das alucinações
Já reclamamos a liberdade
Das nossas paixões
Já juramos nunca sobreviver
A estas estações
De amar e sofrer
E por vezes
Pensamos que o sonho
Era a única razão
Para o amor renascer

II

Já te escrevi palavras de amor
Já me dedicaste poemas
Agora
Ainda sem o saber
Temos os lemas
E três vidas
A resolver

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Persistir


Persistir
Mesmo se a oração
Já não inspira
Frustrante
E o meu ser esvoaça
Contra um céu iníquo
Vazio até da águia errante

Assim já está bem?

Abro-te as pernas
Gentilmente
Envergonhada
Não cedes
Não queres pornografia
Entre nós
Afasto-me
Do triângulo do meu desejo
Equilátero
E no meu desequilíbrio
Nada vejo
Mas vislumbro o erotismo
Que cortejo
Assim já está bem?

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Horizontes

Olho o horizonte
Esbarro em paredes meias
Janelas abertas
Luzes intensas e desertas
Que cegam
Antes de deixar ver
Saio para a rua citadina
Raios de sol cortados
Em detalhes
Complicam a compreensão
Do todo
Subo a colina
Rodeado de electricidade
Nascente
De frenesi dolente
De objectos que não fazem parte
De nada
Subo ao mais alto monte
Que a natureza me concede
Onde o horizonte não se mede
Pela minha vista
Tantas cenas que não vejo
Dentro do meu ver
E depois tanto mundo
Para além deste máximo olhar
Onde nunca viverei
Tantos seres que morrem à luz do sol
Enquanto repouso calmamente
Tanto mundo que imagino
E desconheço
Tanto ser que vislumbro
E não reconheço
Ou nunca verei
Tanto espaço que acolho
À luz que lhe dá vida
E que nunca compreenderei
Encerrado num pequeno sargaço
Do tamanho de um quarto de hotel
Numa história de cordel
Olho o horizonte
Incapaz de o conhecer
Reduzo-me a uma ínfima espécie
E no entanto
Sem a luz
Não haveria nada
Nem saberia
Da cara esfacelada
Nem da dor enclausurada
Nem de tudo o que procuro
Ou que se produz
Nem da alegria
Que momentaneamente
Me seduz
Fico olhando a luz que navega
E que nesta escuridão
Me conduz
À vastidão que cega

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Amo as palavras

Amo as palavras
Que escreves com uma boca
Que não conheço
Amo as angústias que recitas
Com gestos que imagino
Quando adormeço
Amo quando dizes
Que não sabes se vives
Amo os teus silêncios
Em noites e dias
De alegorias
Amo as tuas ausências
O que nunca dirias
Amo a certeza
De que antigamente
Não existias

Tentativas do Ser

Quem tem cabeças abertas
Sem autorização de ninguém
Afirma que apesar de tudo
E da "grande confusão"
O homem é um ser com sorte
Consegue só percorrer
Sem destino e às vezes mudo
Um caminho até morrer
Dando-se ares de eleito
Aparências de perfeito
Enganando até o deus
Que inventou para se explicar
Da incoerência do Ser
Dos longos disfarces do Ter
Vive cansado do temor
De mundos que nunca existiram
Vive em profundo terror
Imagens que o confundiram
Afinal não vale a pena
Realçar o sofrimento
Neste breve súbito instante
Naquele impreciso momento
Tudo se dilui na confusão
E a chamada Existência
É apenas disfunção
(Reflexão sobre afirmações de Manuel Damásio que relatava as suas recentes conclusões sobre "o que vai no cérebro do homem")

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Declaração em nome dos mortais

Depois de algumas investigações

Nada parecidas com as policiais

Estou apto a fazer declarações

Que as faço em nome dos mortais

E por isso sem pejo nem hesitações

A vida é o sopro que agita o animal

Para que um ser esteja vivo

Isto é que tenha veemência e sal

É preciso que o coração bata e se repita

E que a repetição se faça para o bem e para o mal

Portanto não é no bater mecânico do coração

Que se define se tudo está conforme

Viver então começa por ser fome

Um grito de chamamento que ecoa

Pelas sombras

Ou até pelos corredores de um hospital

Depois vem da palpitação a consciência

E do bem e do mal a apetência

A fome de comida tudo justifica

Como aos animais

Mas o homem que eu concebo

Quer sempre mais

Na cabeça está alojado o infinito

Que às vezes se liberta sem saber

Gerando um frémito inaudito

De desejo de fazer e de prazer

E o dono destas ondas bem reais

Pode por vezes ganhar a liberdade

E sem controlo a mente não se esgota

Explode em grandezas sem cidade

E dum pequeno barco faz a frota

Com que vai querer arribar ao porto alto

Sempre mais alto que o porto que ontem foi

Como se o homem qual deus incauto

Não tivesse limites ou não os conhecesse

E portanto no infinito projectado

Só pode acabar ensimesmado

A dizer talvez num canto do universo

"Este desejo que vivo e que almejo

Não está finalmente ao meu alcance

Não quero da vida este relance

Nem viver como o comum dos mortais"

Partir é então o fatídico desígnio

Talvez na esperança que casa com a ignorância

De na poeira onde não reconhece identidade

Ter enfim garantida a eternidade

Como parar então esta amargura

Este anseio esta forma esta demissão

Porque todas as palavras conseguidas

Que se profiram com amabilidade ou com secura

Podem não ter a força e o lastro suficiente

Basta porém na mente

Manter-se impunemente

Esse desejo vital de fazer quase inconsciente

E nada mesmo nada

Conseguirá fazer-lhe frente

Talvez também

E é esse o meu anseio

Descendo da poesia

Caldeado com o prazer da maresia

Um braço caído sem força momentaneamente

Possa remeter em causa esta agonia

Sonhar de novo como se vivia antigamente

Quando a vida corria e se olhava cada presente

Como o bom que a vida conseguia

E o braço já não dormente se mova e diga

Que quer ser de novo da acção o leme

E da vida o símbolo que nunca treme

Aqui o momento geme

E a árvore se agita

E o homem renasce

Na sua bela desdita

domingo, 7 de fevereiro de 2010

La forme de l´autre...

Ils sont couchés
Sur un lit défait
Ses corps mélangés
Ont encore la forme de l´autre

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

ExisTenZ (Redux)

Nasces
Entre a dor e o júbilo
Como nos romances
Que retratam todos os mortais
Vives
Tentando chegar ao púlpito
Num movimento que te absorve
Como a outros heróis venais
Morres
Ainda à procura do amor
E do sentido da vida
Ou de alguns dos seus sinais

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Todas as esperas são cinzentas

Todas as esperas
São cinzentas
Menos a que antecede
A tua chegada
Ainda não estás
Mas já se vislumbra
A aura que te precede
E mais nada

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Incógnita

Passeias incógnita
Nas curvas cintilantes
Da minha memória
Tanta luz que encandeia
O meu presente
Cinzento
Onde agora represento
Este papel inglório
De ídolo evanescente
De momento
Esbracejo como um náufrago
Combato a corrente