sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Isabel, nos anos oitenta...


I
Isabel eras um mito
Vindo do outro lado da vida
Pacote de Winston na mão
Olhar distante
Ou desinteresse
A tua mão era macia

II
Isabel eras o silêncio
Objecto sexual “perhaps”
Passiva como um pássaro apaixonado
O sorriso esbatia-se
Contra as luzes apagadas
Luzes acesas, Luzes apagadas
Esbatia-se
O teu braço era macio

III
Isabel eras uma criança
Os dedos roídos pela impaciência
Saiote branco e folhos
E rendas
A tua vida
Um pouco da tua vida
Eras um Zé
Um amor calculado
Ou desinteressado
Eras o quê
A tua boca era romã
O teu sorriso triste
Eras o mundo à nossa volta

IV
Isabel eras convencional
A tua casa ainda não estava pronta
Móveis melhores, móveis novos
Amanhã tens que ir buscar a tua filha
Eras mãe, eras esposa
O fim
Eras o fim da noite
Pedias desculpa
Nem sei porquê

V
Isabel eras um whisky
Com duas pedras de gelo
Os Beatles
O teu presente
O teu futuro
Um dia deixarás de ser bela
Sê formiga, sou cigarra
Eras a rainha
Com um sorriso triste
Devassada
Eras uma rainha
Quem te conhece
Jura que o fazes muito bem
Eras um impasse
Uma incerteza
Um objecto
A tua vida parecia ser
O prazer dos outros
Por amor
É o amor que te interessa
O amor ou o sexo?
Não sabes do que falas
Tens praticado em demasia
Nem uma só vez
Falaste da cor do mar
Ou do ritmo das ondas

VI
Isabel eras o erotismo
Os seios recortando-se
No azul vermelho da sala
Enchias a noite de sonhos
Sem tempo
Teus lábios eram de facto romãs
Teu corpo era de facto macio
Onde te colava os lábios
Nasciam flores
Quando te fitava os olhos
Brilhavam estrelas
Quando te apertava os seios
Corriam rios
Percorria-te com os olhos cerrados
Como se fosses
O meu caminho habitual

VII
Isabel, nos anos oitenta
Era normal

Sem comentários:

Enviar um comentário