quarta-feira, 7 de abril de 2010

Posso amar como Bécaud

Posso amar como Bécaud uma jovem russa
Numa praça vermelha que regurgite de bolcheviques
Retirados entretanto de circulação

Posso cantar como Brel uma indígena muda
De ilhas longínquas e ignorar os seus caciques
Ou os reis bruxos desse Butão

Posso beijar os campos onde os guetos proliferam
E não sentir o odor do sangue
Nem a maldição ou a maldade humana

Posso vender flores ao desbarato
Para que a todos calhe o seu quinhão
De beleza ou da simples ilusão que jana

Posso reiterar esforços e escamotear contrastes
Imaginar que a vida procura o equilíbrio
Quando já sei que este nunca será atingido

Posso dizer o que penso quando não sonho
Recitar as desilusões que a moral me incutiu
Imaginando que o Homem é tão só
Um um ser fruste e fugidio

Posso tudo o que quiser de peito aberto
Mas chegado o momento estou certo
As páginas voarão para um lugar desconhecido
O céu ficará sem cor
E o pensamento e a dor
Perderão para todo o sempre
O sentido

Sem comentários:

Enviar um comentário